- Temática da luta contra a injustiça
Túmulo de Lorca
Em ti choramos os outros mortos todos
Os que foram fuzilados em vigílias sem data
Os que se perdem sem nome na sombra das cadeias
Tão ignorados que nem sequer podemos
Perguntar por eles imaginar seu rosto
Choramos sem consolação aqueles que sucumbem
Entre os cornos da raiva sob o peso da força
Não podemos aceitar.O teu sangue não seca
Não repousamos em paz na tua morte
A hora da tua morte continua próxima e veemente
E a terra onde abriram a tua sepultura
É semelhante à ferida que não fecha
O teu sangue não encontrou nem foz nem saída
De Norte a Sul de Leste a Oeste
Estamos vivendo afogados no teu sangue
A lisa cal de cada muro branco
Escreve que tu foste assassinado
Não podemos aceitar.O processo não cessa
Pois nem tu foste poupado à patada da besta
A noite não pode beber nossa tristeza
E por mais que te escondam não ficas sepultado
Antínoo
Para uma melhor compreensão do poema, eu realizei uma pesquisa sobre a vida da personalidade em questão( Frederico García Lorca). Federico Lorca foi um escritor, pintor e pianista para além de dramaturgo, que foi assassinado por possuir uma orientação sexual designada pouco convencional. Assim sendo, sob a pessoa de Lorca, Sophia promove a recusa da conformidade("Não podemos aceitar") e a constante luta contra as designadas injustiças("Choramos sem consolação aqueles que sucumbem/Entre os cornos da raiva o peso da força.").
- Temática do gosto pela cultura clássica
Antínoo
Sob o peso nocturno dos cabelos
Ou sob a lua diurna do teu ombro
Procurei a ordem intacta do mundo
A palavra não ouvida
Longamente sob o fogo ou sob o vidro
Procurei no teu rosto
A revelação dos deuses que não sei
Porém passas-te através de mim
Como passamos através da sombra
Antínoo foi um pajem("rapaz de estimação") por quem o Imperador Adriano se apaixonou. Após a sua morte, Adriano mandou construir uma cidade perto do local onde o mesmo morreu, dotou o império Romano de numerosas estátuas(como forma de conservar a sua beleza) e ergueu templos em sua memória.
- Temática do Tempo dividido
Da Transparência
Senhor libertai-nos do jogo perigoso da transparência
No fundo do mar da nossa alma não há corais nem búzios
Mas sufocado sonho
E não sabemos bem que coisa são os sonhos
Condutores silenciosos canto surdo
Quer um dia subitamente emergem
No grande pátio liso dos desastres
Neste poema encontra-se constante a ideia de sonho como principal "alimento" da alma.
- Temática da natureza:
Estações do ano
Primeiro vem Janeiro
Suas longínquas metas
São Julho e são Agosto
Luz de sal e de setas
A praia onde o vento
Desfralda as barracas
E vira guarda-sóis
Ficou na infância antiga
Cuja memória passa
Pela rua à tarde
Como uma cantiga
O verão onde hoje moro
É mais duro e mais quente
Perdeu-se a frescura
Do verão adolescente
Aqui onde estou
Entre cal e sal
Sob o peso do sol
Nenhuma folha bole
Na manhã parada
E o mar é de metal
Como um peixe-espada
Gostei bastante deste poema, especialmente porque contrariamente ao que o título indica("Estações do ano") Sophia presta especial atenção ao verão("O verão onde hoje moro/ É mais duro e mais quente"), facto reforçado a partir da referência feita à praia. Serve-se também do "verão" como factor que evidencia a inevitável passagem do tempo("Perdeu-se a frescura/Do verão adolescente").
Um último poema:
Velório Rico
O morto está sinistro e amortalhado
Rodeado de herdeiros inquietos como sombras
Que atormentam o ar com seus pecados
De forma geral, gostei da poesia de Sophia, no entanto, o facto de não gostar particularmente de poesia condicionou-me um pouco. Defendo que a poesia só é verdadeiramente apreciada quando estabelecida relação com a mesma, no meu caso, apenas quando me identifico de alguma forma com determinado poema, é que me vejo capaz de apreciá-lo plenamente.
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